terça-feira, 18 de agosto de 2015

Entra

Entra

Entra, mas não repara a bagunça. Faz um tempo que venho fazendo companhia aos objetos quebrados e coisas pelo chão. Entra, mas não repara no caos que o último inquilino deixou. Entra... mas, ei?! Como você conseguiu? Não me lembro de ter deixado a porta aberta, não me lembro de se quer de ter tido a intenção de destranca-la novamente. Certamente, foi em um daqueles momentos de distração, em que nossos olhares se cruzaram e apenas sorriram. Destranquei. Nem notei.

Entra, mas não ouvi sequer o teu bater a porta. Tua chegada foi uma grata surpresa, dessas que a gente corre pra fazer um café e arrumar com carinho um lugar a mesa. Entra, mas me desculpa, eu já não tenho uma mesa...   

Entra, que te eu arrumo um cantinho, senta aqui do meu lado. Entra e deixa-me enxergar aqueles olhos que me fizeram colocar a baixo as trancas. Todas as trancas que me jaziam no meu caos particular.

Entra, que desde que você chegou os dias são mais iluminados. Comecei abrindo timidamente uma janela e hoje já ouço a canção que o vento faz passando por todas elas.

Entra, que desde que você chegou, eu não sento mais no chão. Entra que desde que você chegou, eu, que sempre tendo a desordem, me vi querendo arrumar e enfeitar a casa pra te receber.

Entra que eu quero te fazer um bolo de chocolate e perguntar como foi seu dia. Entra que eu quero ouvir você dizendo, como tem vontade de morder minhas bochechas enquanto sorrio. Entra que eu quero eu dividir minhas músicas contigo e o espaço naquela cama de lençóis branquinhos. Entra que eu já não me enxergo fora do teu abraço. Entra, que eu contos os segundos esperando a tua próxima visita.


Entra, mas não repara a bagunça. 

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Tudo bem?



Quando perguntam “tudo bem?” a maioria das pessoas não está preparada para ouvir, qualquer coisa diferente de “sim, tudo bem e com você?”. A verdade é que a maioria, não está nem interessado de fato na resposta, seja qual for ela... Certifique-se de ter alguém por perto, que se importa tanto com você, que seja capaz de suportar o seu “não, não está tudo bem”...

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Retorno...



 






Sabe, eu te entendo... entendo de verdade, ás vezes a gente precisa pegar a contramão pra perceber que já estava trilhando o caminho certo.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Ela: parte I.



Angústia

"Chamamos de angústia a forte sensação psicológica, caracterizada por "abafamento", insegurança, falta de humor, ressentimento e dor. Na moderna psiquiatria é considerada uma doença que pode produzir problemas psicossomáticos."


Desde aquele dia fatídico, se assim posso chamar, Ela chegou. Pequenininha, discreta, mas implorando por atenção, como criança chata que fica puxando a saia da mãe, quando ela está ocupada. Fiz minha parte, a ignorei, na crença que logo Ela cansaria e iria embora. Mas não, Ela não foi, apesar da minha indiferença fez questão de se apresentar e dizer que ficaria por ali mesmo.
A ignorei por dias, cheguei a fingir que Ela não estava ali e segui em frente, pensei que logo Ela morreria já que eu me recusava a alimenta-la. Mas não, Ela se mostrava inabalável.
Coincidência ou não, notei que após sua chegada, aquela certeza que me acompanhou durante quase 22 meses, pouco a pouco foi se esvaindo. Senti que escapava de mim, como a um acidentado que sofrerá de hemorragia. De maneira rápida e intensa, e eu não fazia a mínima ideia do que fazer para impedi-la.
E como eu amava a minha certeza, a nossa certeza aliás. Sempre me enchia, me tomava e eu me deixava dominar pela segurança que a certeza me proporcionava. Ficava  admirando sua imensa capacidade de crescer e cada vez mais, me dar motivos para sorrir.
Certo dia acordei e constatei, definitivamente não estava mais ali, minha certeza havia ido embora sem deixar vestígios, e em seu lugar brotavam uma cascata de dúvidas e interrogações. Multiplicavam-se como que por meiose, numa velocidade a qual eu não conseguia sequer acompanhar.
Enquanto isso, eu mal notara, mas ela havia crescido. Minhas dúvidas e interrogações as alimentava. De pequena Ela já não tinha nada. Passou a surgir a noite, quando eu decidia que ia dormir, ela aparecia e dizia que ainda não era hora. Impiedosa, passou a me fazer chorar e não sossegava enquanto não me esvaziasse por completo.
O dia amanhecia, e por um breve momento eu esqueci que Ela havia dormido comigo. Me sentia disposta a ignora-la novamente, mas bastava a primeira olhada do dia, no espelho, para que ele me lembrasse, através de meus olhos inchados e olheiras proeminentes, que eu não deveria e nem iria esquecê-la. Na verdade, Ela passou a me acompanhar todo o resto do dia. O dia todo, todo dia...
Ficará cada vez mais forte e tinha vontade própria. Localizava-se onde bem queria. Na maioria das vezes gostava de sentar na minha garganta, e só saía quando eu estava prestes a sufocar. Outrora escolhia o estômago como lugar predileto, e se esgueirava por sua boca, me causando dores que antes eu julgava não poderem ser físicas, só sentimentais. Mas o seu lugar favorito... ah o seu lugar favorito, era o coração! Fazia dele sua moradia e por horas recusava-se a ir em bora, de tão grande, Ela mal cabia naquele coração minúsculo, deixando-o extremamente apertado. Doía, como doía...
Meus dias passaram a ser divididos com Ela... quando algo me dizia que eu poderia abandona-la, que bastava eu querer, Ela vinha sorrateira e sempre zombeteira, sorrindo me dava um direito no queixo, me nocauteando mais uma vez.
Eu chorava e implorava para algo maior que fosse no Cosmos, pedindo pra que ela fosse embora... Sentada em minha cama, Ela soprava a fumaça de seu cigarro em meu rosto, desafiadora, afirmava: meu bem, eu vim para ficar.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Fumaça

Desde a última vez que você partiu, tudo aqui fora continua no mesmo lugar. O seu lado da cama continua vazio, o seu travesseiro que adotei como meu, continua com a mesma fronha. Os lençóis continuam com o nosso cheiro. Mas aqui dentro.... Aaaaah aqui dentro,  na  minha estante de sentimentos, os porta-retratos já não mostram as mesmas fotos. Estão em branco, como que a espera do próximo click...
A chama ínfima que aproximei do rosto, iluminou o pequeno cômodo em um clarão. Traguei, uma, duas vezes e logo a fumaça subiu. Observei os contornos sinuosos que ela formava, enquanto pensava o quanto me faz falta não ter você pra dividir desse prazer tão efêmero.

Pensei, pensei também em como seria se o nosso laço fosse desatado, se cada fita fosse para um lado, se eu deixasse você ir ou se eu mesma fosse. Se eu pedisse para você ir ou você não pedisse para eu ficar. Foram tantos Se... Pensei que provavelmente eu sofreria, você sofreria, ambos cairíamos no pesar do perder, mas a vida  seguiria. A vida nunca parou para escutar a lamúria dos amantes. E um dia, quando o sofrimento já não houvesse, seríamos apenas lembranças, já não haveria o Nosso. Eu já não seria sua, você já não seria meu...
Uma lágrima solitária percorreu o meu rosto, mas não foi de tristeza, foi de certeza. A certeza que eu não queria, nem poderia deixar aquele porta-retrato em branco. A certeza de que eu quero preenche-lo repetidas vezes com o nosso futuro. Como, de que maneira eu poderia deixar de querê-lo? Como abdicaria da nossa casa com jardim e do nosso canteirinho de ervas? Da nossa hortinha repleta de hortaliças frescas? De eu brigando com você, salvando nosso cachorro do fumacê? Do café da manhã na cama nos dias de domingo? De passar o dia na cama, só na cama? Do nosso amendoim cozido e da cerveja gelada? Do pé enfiado na areia da praia? Da demonstração de amor mais linda, que é você deixar livre, essas minhas mãos e pés nervosinhos, sempre em busca de um brechinha? Do nosso beijo de boa noite e do cheirinho de bom dia? Das nossas andanças de mãos dadas? Dos nossos “passeios” de ônibus? Da nossa cachacinha? Como eu poderia abdicar da sua empolgação em descobrir, uma receita nova pra cozinhar pra mim? Das nossas caretas? Dos meus bicos que você aguenta? Do meu olhar que você decifra? Das suas palhaçadas? ...

A chama se apagou, a fumaça cessou, mas delas restaram a certeza de que não há nada, nem ninguém, que possa nos transformar em um mero “Eu e Você”, enquanto tudo aqui dentro, ainda for Nosso. 

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Cabeça cheia e coração vazio.

Ela não achava que podia chamar aquilo de tristeza, muito menos de algo depressivo, achava apenas que era um modo diferente de enxergar a vida. Geralmente acontecia quando ela se sentia de cabeça cheia e coração vazio. É como se o modo automático fosse desligado, e ela se visse obrigada a pensar nessas questões existenciais inúteis.  Começava a pensar em como as coisas não faziam sentindo, a vida não fazia sentido, pensava que era tudo tão despropositadamente ilógico, desconexo, irrelevante, fútil e superficial! Desnecessário, talvez fosse essa a palavra. Não conseguia pensar em um proposito simplesmente pra seguir em frente... E quando se via assim, a única coisa que desejava era parar de pensar, parar de pensar e voltar para conforto do seu modo automático. Era tão mais acalentador, tão diferente dessa inquietude que fervilhava a cabeça e balançava o coração oco e ao mesmo tempo pesado. Quando mais nova, se sentia assim, ainda que com uma frequência menor, talvez fosse apenas uma intensidade menor, já não se lembrava... mas nessa época podia caminhar até a casa de uma das avós e como mágica, o modo automático era ligado novamente, havia sempre um xícara de chá quente, ou um copo de leite com achocolatado a sua espera, e o desejo da avó que sempre estava insatisfeita com a frequência das visitas. Regressava para casa  de barriga cheia e mente vazia, e isso lhe causa um enorme conforto.

Ela cresceu, não no tamanho... o tamanho continuava o mesmo, mas os questionamentos já não tinham a mesma proporção, já não podia se dar ao luxo de responde-los com uma proza no fim de tarde com uma  de suas amadas vós. Mas ainda lhe restava um de suas melhores alternativas: um banho quente! O vento gelado soprava frio lá fora e um banho quente seria quase um expurgador espiritual. A sensação era de que a água quente não lavava apenas seu corpo, mas levava junto às impurezas e questionamentos da alma. Era obrigatoriamente longo, quente e capaz de esvazia-la novamente. Ficava a espera de um manifesto do Green Peace a porta do banheiro, certa que gastará água suficiente para abastecer uma família de cinco pessoas por um mês. Exageros a parte, ela sabia que era preciso apenas isso, só assim seria. Ela só precisava de um click, só precisava do seu modo automático de volta. 

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Vento, ventania.


Ela gostava quando o vento batia e soprava em seu ouvido. Gostava de pensar, que ele tinha vindo de longe, compartilhar mais um segredo. Pensava em por quantos tantos outros ouvidos, teria ele sussurrado seus desejos. Ela gostava de senti-lo em sua nuca despida, o calor quase sempre a impedia de mantê-la coberta. Gostava do modo como ele arrepiava os pelos do seu corpo e gostava de pensar, que ainda tantos outros corpos ele iria acariciar.




Sem dúvidas, eles tinham um relacionamento aberto... mas não era amor, era apenas ventania.