Entra
Entra, mas não repara a bagunça. Faz um tempo que venho
fazendo companhia aos objetos quebrados e coisas pelo chão. Entra, mas não
repara no caos que o último inquilino deixou. Entra... mas, ei?! Como você
conseguiu? Não me lembro de ter deixado a porta aberta, não me lembro de se
quer de ter tido a intenção de destranca-la novamente. Certamente, foi em um
daqueles momentos de distração, em que nossos olhares se cruzaram e apenas
sorriram. Destranquei. Nem notei.
Entra, mas não ouvi sequer o teu bater a porta. Tua
chegada foi uma grata surpresa, dessas que a gente corre pra fazer um café e arrumar com carinho um lugar a mesa. Entra, mas me desculpa, eu já não tenho uma mesa...
Entra, que te eu arrumo um cantinho, senta aqui do meu
lado. Entra e deixa-me enxergar aqueles olhos que me fizeram colocar a baixo as
trancas. Todas as trancas que me jaziam no meu caos particular.
Entra, que desde que você chegou os dias são mais
iluminados. Comecei abrindo timidamente uma janela e hoje já ouço a canção que
o vento faz passando por todas elas.
Entra, que desde que você chegou, eu não sento mais no
chão. Entra que desde que você chegou, eu, que sempre tendo a desordem, me vi
querendo arrumar e enfeitar a casa pra te receber.
Entra que eu quero te fazer um bolo de chocolate e
perguntar como foi seu dia. Entra que eu quero ouvir você dizendo, como tem
vontade de morder minhas bochechas enquanto sorrio. Entra que eu quero eu
dividir minhas músicas contigo e o espaço naquela cama de lençóis branquinhos. Entra
que eu já não me enxergo fora do teu abraço. Entra, que eu contos os segundos
esperando a tua próxima visita.
Entra, mas não repara a bagunça.
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